Luxemburgueses na Indonésia? Essa é a surpresa que muitas pessoas têm quando contamos que a LuxCitizenship ajudou algumas famílias (a maioria delas vivendo na Califórnia) a provar que seus antepassados vieram para a Indonésia no século XIX e decidiram ficar por lá.
Tudo isso faz parte de um capítulo pouco conhecido, mas super interessante, da história de Luxemburgo: o período em que soldados luxemburgueses serviram no exército colonial holandês na Indonésia durante o século XIX.
Essa é a história de como mais de mil luxemburgueses atravessaram o mundo e acabaram lutando em guerras nas selvas bem distantes de suas casas. Hoje, seus descendentes estão redescobrindo essa ligação inesperada com Luxemburgo e retomando suas raízes.
A Realidade Histórica: Soldados de Luxemburgo a Serviço da Holanda
Entre 1815 e 1914, o exército colonial holandês (Koninklijk Nederlandsch-Indisch Leger, ou simplesmente KNIL) enviou cerca de 150 mil soldados para as Índias Orientais Holandesas, que hoje conhecemos como Indonésia. No meio dessa enorme força militar, havia também um grupo pequeno, mas marcante: 1.075 soldados luxemburgueses que se voluntariaram para servir nas colônias tropicais.
Esse número, revelado por pesquisas acadêmicas recentes dos historiadores Ulbe Bosma e Thomas Kolnberger, mostra um capítulo impressionante (e pouco lembrado) da história de Luxemburgo. Não se tratava de campanhas militares do próprio país, mas sim de homens luxemburgueses que decidiram se alistar nas forças coloniais holandesas, como parte de um esforço de recrutamento que envolvia vários países da Europa. Faz sentido se pensarmos que, naquela época, o Grão-Duque de Luxemburgo também era o Rei da Holanda.
Por que os Luxemburgueses se Juntaram ao KNIL
O KNIL funcionava quase como uma “Legião Estrangeira”: recrutava não só holandeses, mas também alemães, belgas, suíços e, claro, luxemburgueses que atuavam como mercenários. Para muitos jovens de Luxemburgo no século XIX, servir no exército nas Índias era uma oportunidade que o seu país natal não podia oferecer: salário fixo, bônus de alistamento e até a chance de crescer na carreira.
Naquela época, Luxemburgo era um dos países mais pobres da Europa. As oportunidades eram poucas, e a emigração — fosse para a França, Bélgica, Estados Unidos ou, nesse caso, para as colônias holandesas — era muitas vezes a única saída para melhorar de vida. Os recrutadores do KNIL ofereciam adiantamentos em dinheiro, algo muito tentador em tempos de crise, tornando o serviço colonial uma alternativa atraente à pobreza.
Curiosamente, pesquisas mostram que os soldados luxemburgueses tinham perfis diferentes dos holandeses. A maioria vinha de áreas urbanas, não tinha grande experiência militar e se alistava mais pelo ganho financeiro imediato do que por planos de fazer carreira nos trópicos do novo mundo.
Um Exemplo: Paul François Jules Augustin
Para entender melhor esse contexto histórico, olhemos para a história de Paul François Jules Augustin, nascido em Diekirch em 19 de agosto de 1850. A trajetória dele representa bem a experiência de muitos soldados luxemburgueses que serviram nas colônias.
No dia 6 de julho de 1877, Paul François Jules Augustin se alistou voluntariamente no KNIL para um período de seis anos. Diferente de alguns recrutas que recebiam adiantamento em dinheiro, o contrato dele só começou de fato quando embarcou. Em 4 de agosto de 1877, partiu de Roterdã a bordo do navio a vapor Friesland e chegou a Batávia (atual Jacarta) em 18 de setembro de 1877.
Sua carreira militar aconteceu inteiramente nas Índias. Poucos meses depois de começar, já havia sido promovido a cabo e, em 1879, a sargento. Em 1884, ele decidiu se alistar novamente — dessa vez recebendo uma bonificação de 300 florins por mais seis anos de serviço. Os registros militares mostram que ele participou da Guerra de Aceh (1873–1904), o conflito colonial mais longo e sangrento do Império Holandês.
O mais marcante fato, porém, é que Augustin decidiu permanecer na Indonésia depois de cumprir seu serviço militar. E em 1902, casou-se com Maria Williams em Semarang e formou uma família que permaneceu na região de Surabaia — como aconteceu também com outros luxemburgueses. Somente nos anos 1990 seus descendentes emigraram para a Califórnia, mais de um século depois da primeira viagem de Augustin saindo de Luxemburgo.
Conexões Atuais: Reivindicando a Cidadania Luxemburguesa
Hoje, os descendentes desses soldados coloniais estão redescobrindo suas raízes em Luxemburgo e buscando recuperar a cidadania de seus antepassados. Esse processo, embora juridicamente complexo, é uma continuação fascinante da história de migração que começou mais de um século atrás.
Muitas dessas famílias seguiram um caminho parecido: de Luxemburgo para a Indonésia no século XIX e, depois, para a Califórnia nos anos 1990. O estado dourado dos EUA, com sua diversidade e oportunidades econômicas, acabou se tornando o novo lar para famílias luso-indonésias, que passaram a preservar esse duplo legado enquanto construíam uma nova vida.
Mas provar essa conexão ancestral não é simples. O sistema descentralizado de registros na Indonésia, especialmente no período colonial, torna difícil a localização de documentos essenciais. Certidões de serviço militar, registros de casamento e nascimentos da época das Índias Orientais Holandesas exigem conhecimento especializado para serem encontrados e autenticados.
A Experiência da LuxCitizenship
A LuxCitizenship já ajudou com sucesso mais de dez descendentes indonésios de luxemburgueses a obter a dupla cidadania de Luxemburgo por direito de ancestralidade. Nossa primeira aplicação bem-sucedida aconteceu em 2021, antes mesmo de a Indonésia entrar na Convenção da Apostila de Haia
Naquela época, cada registro civil indonésio precisava ser obtido junto à autoridade local, muitas vezes exigindo etapas adicionais ainda na Indonésia, depois traduzido para o francês e legalizado. A legalização era um processo demorado: primeiro, o documento recebia uma certificação especial de um ministério ou autoridade do país de origem confirmando a autenticidade da assinatura. Em seguida, o candidato precisava levar o documento à embaixada do país de destino para legalizar também essa certificação.
Como Luxemburgo não possui embaixada na Indonésia, tivemos que trabalhar com a Embaixada dos Países Baixos, que representam os interesses de Luxemburgo por lá. Foi preciso muito esforço e negociação para conseguir o apoio deles, mas no fim deu certo. Com os registros indonésios devidamente legalizados, nossos clientes conseguiram obter a cidadania luxemburguesa.
Desde junho de 2022, a Indonésia passou a fazer parte da Convenção da Apostila de Haia e agora emite apostilas, o que simplifica bastante um processo conhecido por ser complexo.
A LuxCitizenship talvez seja o único serviço no mundo a apoiar indonésios descendentes de luxemburgueses na recuperação da dupla cidadania. Se você é indonésio com ascendência luxemburguesa (estando na Indonésia, nos Estados Unidos ou em qualquer outro lugar) não hesite em nos procurar para obter maiores informações.
Este artigo se baseia nas pesquisas históricas de Ulbe Bosma e Thomas Kolnberger, publicadas em “Military Migrants: Luxembourgers in the Colonial Army of the Dutch East Indies” (Itinerario, Cambridge University Press, 2017), além de pesquisas genealógicas realizadas em nome de descendentes que buscam a cidadania luxemburguesa por ancestralidade.